Roteiro de suspense no Hornet

Matt Damon

Eu sabia que, ao começar a escrever sobre relacionamentos gay e apps de pegação (Hornet, Tinder, Happn, Grindr, Scruff e tantos outros…), estaria mexendo num vespeiro. Bastante gente comenta comigo os casos pessoais nas DMs, nos bares e na vida. Não é fácil pra quase ninguém… Mas tem gente que se supera na crueldade, como neste caso de um amigo que pediu para não ser identificado e mais parece um roteiro de suspense gay.

O encontro perfeito é impossível… Ao vivo tudo é diferente. Se tiver tesão pode ser legal, sim, mas tudo depende da química. O povo no Hornet ama enrolar: só querem ver fotos e tchau. Já me danei nesses apps, mas agora estou esperto. Os gays usam de muitas artimanhas, inclusive usar fotos de homens hétero para ver seus nudes. Uma vez marquei um encontro e quando cheguei lá era um homem muito mais velho que usava as fotos de um bonitão para tentar algo.

Em outra vez foi bem pior. Fui enganado. Cheguei no local era um golpe. Foi horrível. Aconteceu assim… Nos falamos várias vezes no Hornet. No dia que marcamos de nos ver, aconteceu… Cheguei no prédio, me anunciaram pelo interfone para ele, abriram a porta. Era um apartamento de alto luxo, dava pra ver que era muito rico. Fiquei no hall de espera aguardando ele…

Logo que cheguei lá, o app acusava que ele estava a uma distância de 3km e assim que percebi isso, ele parou de responder. Eu fiquei lá esperando. Criei uma conta nova no Hornet e na hora eu vi: ele tinha me bloqueado e estava a 3km dali. Quando me levantei para ir embora, a mãe dele apareceu e falou: “Sobe ou eu chamo a polícia.” Eu, tonto, subi. Aí começou o sermão. Fiquei uns 50 min lá passando vergonha.

Ela falava: “Como você marca um encontro com quem não conhece?” Perguntava se não tinha medo de ser morto. Até se eu estava levando droga na bolsa ela perguntou. Ela abriu e revistou minha bolsa. Falou que era advogada e que ia chamar a polícia. Comecei a chorar. Eu não tinha me assumido como gay, então fiquei com medo. Sei que ela pegou minha CNH e tirou uma foto. Chorei e tremi tanto que ela no fim ficou com dó e me deixou ir. Saiu comigo e me levou até meu carro, eu entrei e ela ficou me olhando ir embora.

Não sei como cheguei em casa dirigindo. Gay no armário, sendo levado na delegacia. Como ia explicar, o que ia dizer em casa? Depois de uns 10 min dirigindo, parei o carro. Chorei de soluçar. Não conseguir dirigir. Quando me recuperei, voltei para casa e tive que fingir que estava tudo bem.

O mais aterrorizante da história é a falta de apoio em que nos vemos em situações como essa, em que o medo da própria condição é tão assustador.

Ai vieram os questionamentos. Quem era? Por que me fez ir até lá? Por que abriram a porta e mandaram eu esperar no hall de entrada? Por que fez eu subir? Por que tirou foto da minha CNH?

Lembro que fiquei tão envolvido no app com ele que não tirei print do papo todo, só do endereço e da foto do perfil. Me dei conta do vacilo quando cheguei lá e ele me bloqueou. Se não tivesse essas duas provas, que iam achar de mim ou fazer comigo? Como provar que eu estava dizendo a verdade e havia sido enganado? Disse ela que o filho era hétero, que naquela hora estava na faculdade. Mas por que na localização do app até eu chegar dizia que ele estava por lá? O tempo que fiquei esperando no hall foi o tempo dele sumir 3km e me bloquear.

Fiquei semanas desesperado, sem chão. Sem ter a quem recorrer. Se fosse fazer BO iam descobrir que eu era gay. Fiquei num mato sem cachorro. Mandei para o Hornet o que aconteceu. Nem me responderam. Isso foi em fevereiro de 2016. Percebi a duras penas que esses apps são furada. Nem o próprio Hornet ajuda o usuário em problemas. Chorei de medo do que iria acontecer com tudo isso.

O fardo foi pior pelo medo de me descobrirem gay. Ledo engano: todos já sabiam e fui besta na época de pensar que não. Se na época pensasse diferente, o desfecho seria outro. Tinha eu mesmo chamado a polícia para aquela gente. Por isso que hoje deixo meu perfil fechado, escolho pra quem me mostro.

Depois disso nunca soube o desfecho do assunto. Até hoje não sei; e acredito que nunca vou saber. Já me perguntei muito sobre isso e não chego a conclusão nenhuma. Só sei que tive sorte de sair vivo dessa, podia ter morrido, levado um tiro. Tantos loucos que odeiam gays.

A mãe dele era rica, fina, bem arrumada. O apartamento era um luxo, em São Bernardo (SP). Não era um zé-ninguém, era um prédio de alto padrão, onde não entra qualquer um. Por isso me pergunto: quem autorizou minha entrada quando cheguei? Por que mandou esperar e me fez ficar ali um tempão? Queria tempo pra que?

É bom contar essa história, para muitos que vão às cegas em encontros. Tem muito gay inocente, que quer um príncipe idealizado. Aí cai igual eu cai. Nessa eu aprendi: os bonitos ficam com os bonitos; os feios com os feios. Os ricos pagam pelo sexo com os bonitos se forem feios. O mundo gay cruel segrega. Isso é real.

App gay virou cabide de emprego, oportunidade de se dar bem em cima de gay besta, fazer extorsão… Isso pq quem leva o golpe fica anônimo, por que sabe que quem se expõe pode se ferrar. Quem quer ir na polícia fazer BO e ser humilhado? Exposto como gay safado? O gay hoje em dia se diz empoderado, acha que o mundo é dele. Mas na verdade não e nada disso. O próprio meio gay está sufocado, segregado…

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