O que aconteceria se…?

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“E se…?” é uma série dos quadrinhos da Marvel para contar histórias conhecidas de suas tramas de diferentes maneiras, explorando outras formas de como seu universo teria se desenrolado caso mudassem momentos-chave. Li incrédulo várias histórias de X-Men ou Vingadores que se passavam num impossível cenário que parte da hipótese de o que aconteceria se o Nazismo tivesse prosperado.

Como por exemplo: “o que aconteceria se…” Magneto (um mutante judeu egresso dos campos de concentração em Auschwitz quando criança) dominasse os EUA _e que de certa forma foi explorado nos filmes? E se o Capitão America não tivesse sumido na Segunda Guerra para voltar anos depois? Spoiler: ele seria promovido a diretor da S.h.i.e.l.d. quando envelhecesse e seu substituto morto por soldados nazistas no futuro.

Estou revendo agora o seriado “The Man in the High Castle”, um dos cartões de visita da Amazon Prime Video, um tanto maravilhado pela direção de arte, figurino e caracterizações. Nele, vemos o que seria dos EUA caso tivessem perdido a Segunda Guerra e fosse dividido meio a meio entre o Grande Reich e o Império Japonês.

Eugenia, genocídio e ataque a minorias regulamentados são resultados bastante previsíveis do enredo, mas que ainda assim chocam pelo absurdo de sua violência. Nada explicitado, pelo contrario, é tudo normatizado e parte do cotidiano dos anos 1960 bem diferente de como conhecemos.

Vejo o noticiário político brasileiro com o mesmo distanciamento de leitura de uma realidade alternativa. Nem “BlackMirror”, “Jogos Vorazes” ou mesmo “Além da Imaginação” seriam capazes de prever o que passamos hoje, em que nega-se o passado sangrento de 25 anos de Ditadura Militar, em que a tortura era um instrumento governamental de lidar com opositores ao regime, sumindo para sempre com ossadas de centenas de militantes.

Compreensível que tanto tempo de imprensa, entretenimento e cultura sob censura tenham vendado os olhos de muita gente sobre a gravidade de anos e anos de opressão. Some isso à infame Lei da Anistia, que manteve até hoje impunes os executores para que pudessem continuar contando sua história. Como se houvesse outra versão para as mortes que causaram deliberadamente, por simples diferença ideológica.

Tantos anos depois, a internet, no entanto, mudou o horizonte de nosso tempo. Ampliou o volume de informação, abriu dados infinitos sobre tudo o que se possa imaginar _história, pornografia, receitas, filmes, o que fosse… A impressão, no início era de que o acesso permitiria que evitaríamos nos enganar novamente ou cair em mentiras, conectando pessoas, órgãos de governo e da imprensa, bibliotecas, museus.

Pois temo _como jornalista, eleitor, nascido no Brasil durante uma Ditadura militar (e, agora cabe aqui admitir, alinhado com pensamentos de esquerda)_ que estejamos brincando em 2018 de “o que aconteceria se…?” E se negássemos nosso passado, e se a internet servisse para emburrecer ao invés de aprender, nos fechasse em pequenos grupos ou se somente lêssemos (pior, acreditássemos) o que nos agrada?

A diferença é que não há heróis, assim como não há um guardião da trama temporal que possa corrigir esse desvio pós-verídico, não há o olhar crítico necessário para filtrar o que é ponto de vista e o que é um absurdo. Já pensou que doideira seria viver em uma distopia digna de histórias em quadrinhos? O que aconteceria se…? 2019 está logo ali para nos responder.

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