“Gira” – Grupo Corpo
Faz alguns anos que eu vou assistir religiosamente à apresentação anual do Grupo Corpo no teatro Alfa, em São Paulo, e desta vez acompanhei a Erika Palomino na noite de estreia. O que a companhia de dança de Belo Horizonte costuma fazer em suas turnês é apresentar sempre uma peça antiga e uma inédita. Na temporada que abre amanhã (04.08) e fica até o dia 13, repete “Bach” (1996), com a trilha baseada na obra do compositor alemão. E a novidade deste ano é o balé “Gira”, seu 39º espetáculo, em homenagem a Exu, com a moderna música do trio Metá Metá e participação especial de Elza Soares.
Os irmãos Pederneiras têm 40 anos de repertório e estou longe de ter assistido tudo. Posso dizer que dentre as que vi tenho várias apresentações favoritas, mas “Parabelo” (1997) está no topo da lista, pela sofisticação com que trabalha os movimentos “brasileiros”, se é que dá para categorizar assim a quebra safada dos quadris e de pernas que só se vê no elenco desse grupo. O próprio coreógrafo Rodrigo Pederneiras define esta como “a mais brasileira e regional” de suas criações, que leva um toque cadenciado do baião. Este efeito tem ainda mais força com a trilha de sons sertanejos “Xiquexique”, composta por Tom Zé e José Miguel Wisnik e na voz de Arnaldo Antunes.
“Gira”, por sua vez, tem alma africana e nasceu (20 anos depois) nos terreiros de Umbanda. Quando não estão em cena, os 21 bailarinos não entram para a coxia, ficam o tempo todo sentados em círculo, cobertos por um véu preto. Esta ciranda sob iluminação tênue do cenário de Paulo Pederneiras dá logo de cara o peso espiritual que tem a apresentação toda, e que vai crescendo junto com o som do tambor. Abre conexão com um outro aspecto das muitas personalidades do Brasil: é dramático, denso e contrastante.
Mesmo com todo respeito às tradições, a apresentação transcende religiosidade. É espiritual, mas também muito sexual. A coreografia usa as figuras das entidades e dos orixás para celebrar a dança de um modo enérgico, vibrante. Tem um contato muito próximo com a ideia de masculinidade, pela brutalidade dos seus movimentos e pelo contorno dos músculos acentuados pelo foco de luz sobre eles.
O lindo figurino de Freusa Zechmeister, por sua vez, não é definido por gênero: estão todos com o peito nu e vestindo saias brancas de tecido cru, que complementam os movimentos de pernas ao longo da performance. São 40 minutos pulsantes que não caem em referências óbvias, ao contrário, oferecem uma visão muito própria da matriz africana pelo viés do corpo e, especialmente, os corpos do Grupo Corpo. É uma obra muito marcante e que mostra a enorme evolução da companhia em todos esses anos.
Que ótima dica. Adoro espetáculos de dança.
Eu tb adoro, e os do Grupo Corpo especialmente!
Volte sempre 🙂